Ficção científica: a razão de ser

Por que ficção científica? E por que não? Sim, vivemos no Brasil, na América Latina, mais famosa por seres sobrenaturais do que por aventuras espaciais ou viagem no tempo. Mas não vejo nenhum problema com a ficção científica. Cresci assistindo a séries e filmes e lendo HQs do gênero. Eu era um guri muito racional, do tipo que se sentia meio imbecil vendo as aventuras do ladrão de Bagdá, mas que aceitava mais facilmente o fato de alguém usar um artefato tecnológico para voar do que fazê-lo com um tapete mágico. Mesmo o realismo fantástico me parece insuficiente. Apesar de gênios do calibre de Jorge Luis Borges, parece que a maioria dos autores que se atrevem a escrever “realismo fantástico latino-americano” o fazem como se estivessem pedindo desculpas por evitar o drama psicológico, ou o existencialismo, ou o drama intimista urbano, a vida “real”.

Eles também têm medo de serem chamados de colonizados, como se a ciência e, mais importante, suas possibilidades e consequências sociais e culturais, fossem privilégio de norte-americanos, europeus e asiáticos. Vou além. Parece que esses intelectuais assumem que nós, Brasileiros, somos pobres demais para imaginar outros mundos ou para reimaginar nosso próprio mundo sob um prisma minimamente racional.

Na cabeça desse povo, o fantástico só pode surgir do misticismo, já que somos “uma nação de raízes rurais com um vasto repertório de mitos”. Acontece que a humanidade inteira tem uma raiz rural. Começamos caçadores coletores, depois viramos fazendeiros. Gosto do campo. Também me sinto atraído pela natureza selvagem. Só que não vejo motivo para que limitemos a experiência humana ao meio rural ou à vida na floresta. Não é preciso ser um cientista para ler ficção científica. Basta gostar de ler e ter sincera curiosidade sobre o mundo em que você vive.

O último aspecto que sempre aparece em discussões sobre o gênero: “ah, mas os personagens são tão rasos…”, em minha modesta opinião, isso é balela. Você encontra personagens toscos em qualquer tipo de literatura. Até mesmo na “alta literatura”. Não é um gênero que torna um personagem denso ou bem fundamentado. Essa responsabilidade é unicamente do autor. Como já disse o grande Bráulio Tavares em seu livro O Que É Ficção Científica: “Não existe uma hierarquia entre as ficções. Madame Bovary não é mais real que Flash Gordon.” Tudo é ficção. E a ficção científica, junto com a fantasia, se constitui num dos melhores, senão o melhor gênero para discutir as grandes questões que nos interessam aqui e agora. Vivemos num mundo em transformação. Muda a tecnologia, mudam os costumes, muda o meio-ambiente. Se perguntar de onde viemos e para onde vamos, não é apenas uma das mais elevadas questões de nosso tempo. Nela, pode estar a chave da sobrevivência de nossa espécie, num futuro não muito distante.

Então, sejam bem-vindos a este blog. Espero que apreciem sua leitura tanto quanto apreciei escrevê-lo. Obrigado!

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